Introdução
Desde que divulguei o Blog Mosqueiro Pará Brasil e nele
passei a publicar diversos temas, o artigo mais procurado até o momento é
aquele que trata das praias de Mosqueiro. Para mim, um recado claro que o
leitor do Blog está enviando – a orla praiana de Mosqueiro é um tesouro que
precisa ser protegido e preservado para essa e futuras gerações. Diante desta
evidência, ficam duas questões para serem respondidas. O que fazer? Como fazer?
(Ilustração 1:orla da praia do Areão, ao fundo, e orla praia do Bispo, em primeiro plano)
O grande fascínio que a orla
praiana de Mosqueiro causa nas pessoas e as oportunidades que ela oferece,
incluindo as lucrativas, trouxeram algumas consequências que precisam ser
encaradas com responsabilidade e competência. A primeira delas foi a conformação
do perímetro urbano que se estabeleceu seguindo o colar de praias, a ponto de
muitos bairros receberem o nome das mesmas. Outra consequência foi uma ocupação
intensa e muitas vezes desordenada por falta de regramento, fiscalização
deficiente e ganância de atores que tentam tornar privado o que é público por
definição. O comprometimento do equilíbrio ambiental da orla e a sua ocupação
para fins privados são certamente o que mais preocupa.
(Ilustração 2: orla da praia do Chapéu Virado)
O texto que apresento a
seguir tem como objetivo principal mostrar a importância de formular um Plano
de Gestão Compartilhada para a Orla Praiana de Mosqueiro. Neste sentido, o
texto abordará, inicialmente, o arcabouço legal responsável pelo
estabelecimento de regras que visam o ordenamento da orla de municípios costeiros
e, em particular, de Belém do Pará do qual Mosqueiro faz parte, bem como
definições contidas nesta legislação. Na sequência, oferece alguns elementos
que permitam a caracterização da orla praiana de Mosqueiro nos seus aspectos
físicos, nas formas de uso e ocupação do território e alguns impactos
decorrentes dos mesmos. Concluindo, justifico e ofereço uma alternativa, já
testada em outros municípios, capaz de colaborar na obtenção do objetivo final desejado
que é a proteção e preservação da orla de Mosqueiro para essa e futuras
gerações.
(Ilustração 3: orla da praia do Ariramba)
Para produzir esse texto,
lancei mão de alguns trabalhos realizados por mim e outros de alguns colegas
pesquisadores, isso fez com ele assumisse colorações de um artigo acadêmico/científico
sem que tenha sido essa a intenção. De qualquer forma, é mais uma contribuição
que ofereço aos leitores deste Blog
e uma fonte de consultas para pesquisadores e gestores públicos.
(Ilustração 4: orla da Baía do Sol)
Algumas
definições e fundamentos legais.
A orla pode ser entendida
como uma unidade geográfica delimitada pela faixa de interface entre a terra
firme e o corpo hídrico que pode ser o oceano, um rio, um estuário, ou um lago.
É um ambiente que se caracteriza pelo equilíbrio morfodinâmico, no qual
interagem os fenômenos aquáticos e terrestres, sendo os processos geológicos e a
morfodinâmica das águas os elementos básicos para a definição do tipo de orla.
Quanto ao conceito de praia, o art. 3º da Lei n° 7.661/88 – Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro – PNGC, estabelece que é a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da
faixa subsequente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua
ausência, onde comece outro ecossistema.
(Ilustração 5: praia em Mosqueiro)
Quanto ao domínio, as praias
são consideradas na Constituição Federal – CF/88 um “bem de uso comum do povo”,
portanto destinado ao uso coletivo, inalienáveis, impenhoráveis e insuscetíveis
de serem oneradas. Reafirmando o preceito estabelecido na CF/88, o art. 10 da Lei
n° 7.661/88, estabelece que as praias são
bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco
acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos
considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas
protegidas por legislação específica. Simplificando, as praias pertencem a
todos os brasileiros e a estes deve ser garantido o livre acesso, “praia
particular” só existe na mentalidade daqueles que se julgam “acima da Lei”.
Ao falar da unidade
territorial denominada “orla”, isto é, de uma região que ultrapassa os limites
técnicos do elemento denominado praia, devemos considerar, ainda, os chamados
“terrenos de marinha” e seus “acrescidos”. Apesar da confusão que muitas
pessoas fazem a esse respeito, “terrenos de marinha” não pertencem à Marinha de
Guerra. São áreas com influência da maré, podem estar situadas no continente;
na costa marítima; nas margens dos rios e lagoas, e no contorno das ilhas, até
onde se faça sentir a influência das marés, em uma profundidade de 33 metros
medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha de preamar médio (LPM) do ano de 1831 (Art. 2º, DL nº 9.760/46). Seus “acrescidos” são as áreas que
foram formadas, natural ou artificialmente, para o lado do mar, dos rios e
lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha.
Ao tratar dessas áreas, a
CF/88 estabelece em seu artigo 20 que se trata de patrimônio da União, cabendo
a Secretaria do Patrimônio da União - SPU a incumbência de fiscalizar e zelar
para que sejam mantidas a destinação e o interesse público, o uso e a
integridade física desses imóveis, podendo, para tanto, por intermédio de seus
técnicos credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais
sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e
solicitar o necessário auxílio de força pública estadual. Cabe aqui ressaltar
que quando falo em União, estou me referindo ao ente da República Federativa do
Brasil que representa os interesses de todos os brasileiros, indistintamente.
Segundo o parágrafo 4º do
artigo 11 da Lei Federal 9.636/98, constitui obrigação do Poder Público
federal, estadual e municipal, observada a legislação específica vigente, zelar
pela manutenção das áreas de preservação ambiental, das necessárias à proteção
dos ecossistemas naturais e de uso comum do povo, independentemente da
celebração de convênio para esse fim.
A Lei 9.636/98 também estabelece, no artigo 18, que
a critério do Poder Executivo poderão ser
cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer dos regimes
previstos no Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, imóveis da União a Estados, Distrito Federal, Municípios e entidades
sem fins lucrativos das áreas de educação, cultura, assistência social ou
saúde; e também para pessoas físicas ou jurídicas, em se tratando de
interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de interesse
nacional. Ainda, no artigo 18, o
parágrafo 2º estabelece que o espaço
aéreo sobre bens públicos, o espaço físico em águas públicas, as áreas de álveo
de lagos, rios e quaisquer correntes d’água, de vazantes, da plataforma
continental e de outros bens de domínio da União, insusceptíveis de
transferência de direitos reais a terceiros, poderão ser objeto de cessão de
uso, nos termos deste artigo, observadas as prescrições legais vigentes; e
o paragrafo 5º diz, a cessão, quando
destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre
que houver condições de competitividade, deverão ser observados os
procedimentos licitatórios previstos em lei. Aplicando esses preceitos
legais na orla praiana de Mosqueiro, significa que bares, restaurantes,
barracas de praia e outros empreendimentos com fins lucrativos deveriam passar
por processos licitatórios para cessão do espaço e seu uso deveria sofrer um
maior rigor na fiscalização do uso, por parte dos órgãos competentes, para
evitar possíveis irregularidades.
Saindo um pouco da
legislação patrimonial, devemos também observar a legislação urbanística,
sobretudo quando estamos tratando da necessidade de ordenamento da orla praiana
de Mosqueiro que está localizada, segundo o Plano Diretor de Belém, na Macro
Zona do Ambiente Urbano, subdividida em
duas Zonas (ZAU 1 e ZAU 2), cuja principal distinção é o grau de adensamento
das mesmas.
Com a aprovação da lei
federal 10.257, de 10 de junho de 2001, mais conhecida como Estatuto da Cidade,
o Congresso Nacional regulamentou o que a Constituição Federal dispõe no
capitulo relativo à Política Urbana. O Estatuto da Cidade reuniu normas
relativas à ação do Poder Público na regulamentação do uso da propriedade
urbana em prol do interesse público, da segurança e do bem-estar dos cidadãos,
bem como do equilíbrio ambiental.
O Estatuto da Cidade definiu
também as diretrizes norteadoras da política urbana no Brasil: a função social
da cidade e da propriedade onde o interesse coletivo prevalece sobre o uso da propriedade
individual; a gestão democrática, garantindo a participação da população em
todas as decisões de interesse público; a justa distribuição dos benefícios e
dos ônus decorrentes dos processos de urbanização; a recuperação da valorização
imobiliária resultado dos investimentos públicos em infraestrutura social e
física; a adequação dos instrumentos da política econômica, tributária e
financeira dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano; o
direito à cidade sustentável onde o cidadão terá acesso à habitação digna, aos
serviços, aos equipamentos urbanos e a toda melhoria realizada pelo poder
público; e, a integração e complementariedade entre as atividades urbanas e
rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do
território sob sua área de influência.
Entre as determinações estabelecidas pelo Estatuto da Cidade está aquela na qual os municípios que possuem
Plano Diretor, com mais de dez anos, devem revê-los. Assim sendo, em 30 de
julho de 2008, foi promulgada a Lei 8.655 dispondo sobre o Novo Plano Diretor
de Belém. Seguindo os ditames da nova legislação urbanística do País, ele trata
do desenvolvimento municipal considerando a integralidade do seu território
(continental e insular), suas especificidades e os interesses legítimos de seus
cidadãos. Adota como princípios fundamentais do desenvolvimento municipal a função social
da cidade, a função social da propriedade, a sustentabilidade e a gestão
democrática.
O Plano Diretor de Belém, no
art. 108, define as Zonas Especiais de Interesse Ambiental (ZEIA) como espaços livres ou ocupados, de domínio
público ou privados, cujos elementos do ambiente natural assumem função de
interesse público, por serem importantes para a manutenção do equilíbrio
socioambiental do Município. No art. 111, aponta as orlas das ilhas de
Mosqueiro, Caratateua e Cotijuba entre as Zonas Especiais de Interesse
Ambiental. As orlas urbanizadas ficam definidas como zonas de interesse para
fins de recuperação urbanística, paisagística e do patrimônio arquitetônico,
enquanto que as orlas com urbanização incipiente ou não urbanizadas, com
elementos de preservação do patrimônio histórico-cultural, ficam definidas como
zonas de interesse ambiental, arqueológico e histórico. A orla praiana de Mosqueiro
apresenta as duas situações. A título de exemplo podemos dizer que as orlas das
praias do Farol, Chapéu Virado, Porto Arthur, Murubira e Ariramba estão
afetadas pelo primeiro caso; enquanto que as orla das praias do Bosque, Maraú,
Caruara e Paraíso, pelo segundo.
(Ilustração 8: mapa mostrando a orla de Mosqueiro enquanto Zona Especial de Interesse Ambiental)
Mecanismo instituído no art.
65, do Plano Diretor de Belém, com grande importância para a orla praiana de
Mosqueiro, são os Corredores de Integração Ecológica. Para a efetiva
implementação do programa de Corredores de Integração Ecológica, o art. 66
estabelece que deva ser prevista uma faixa de domínio ao longo dos cursos
d’água, determinando larguras mínimas e máximas. No caso das orlas das praias e
demais ilhas do Município de Belém, considera-se área non aedificandi a faixa mínima de 100 metros, a partir da linha de
maior preamar. Significa, na prática, que não se pode mais realizar novas
edificações ou ampliação das existentes dentro dessa faixa de 100 metros, a
contar da mais alta preamar verificada. Lamentavelmente esse importante dispositivo
não vem sendo respeitado.
Particularidades
da orla praiana de Mosqueiro.
Localizada na face oeste de
Mosqueiro, a orla praiana se estende de norte a sul do arquipélago. São cerca
37,5 km de extensão, da ponta onde se localiza a antiga Fábrica Bitar, na baía
de Santo Antônio, até a foz do igarapé Irapara, na baía do Sol. Suas enseadas abrigam
vinte e três (23) praias, conforme a denominação de moradores locais. O
adensamento da ocupação está relacionado aos vetores de uso e ocupação
territorial, verificados a cada período de desenvolvimento, a implantação da infraestrutura
acompanhou a tendência desses períodos. É na orla que encontramos muitos
elementos relacionados à história, são os sítios agrícolas da baía do Sol, a
praia do Chapéu Virado e praia do Bispo que foram palcos de importantes batalhas
da Cabanagem, e os Casarões do período áureo da borracha.
·
Aspectos
Físicos.
A Ilha do Mosqueiro pode ser
subdividida em duas seções fisiográficas principais: os Terraços Aluviais Pleistocênicas
que são áreas mais elevadas, com altitudes entre 15 e 25 m, constituídas por
sedimentos arenosos, siltosos e argilosos caoliníticos, representando 2/3 da
superfície da ilha; e as Planícies Aluviais de Inundação que são periodicamente
ou permanentemente inundadas, são áreas planas, com altitudes entre 5 a 10 m e
constituídas por sedimentos argilosos e siltosos, pouco desenvolvidos,
pertencentes à formação mais recente, ou Holoceno (Costa & El-Robrini,
1992). Em alguns
trechos da orla, os terraços se aproximam formando falésias (barrancos), é o
caso das praias do Bispo, praia do Ariramba, e praia do Bosque. Na orla das praias do Maraú e Caruara as planícies de inundação predominam.
(Ilustração 9: fotografias mostrando as Falésias/Barrancos existentes nas prias do Bosque e Ariramba)
A Zona Estuarina (Estuário)
é o baixo curso de um rio ou seção da planície costeira, escavada pelas águas
oceânicas durante a subida do nível do mar (Holoceno). Contém águas oceânicas diluídas às
águas doces (drenagem), afetadas pelos movimentos das marés. Esta mistura de
águas doce e salgada nesta zona de transição cria um ambiente distinto, onde
diversas comunidades aquáticas se desenvolvem, gerando condições que tornam os
estuários um dos ecossistemas mais produtivos. As águas que banham a orla
praiana de Mosqueiro pertencem à baías de Santo Antônio, Marajó e baía do Sol, complexo hídrico localizado na Zona Estuarina do Amazonas e do
Araguaia/Tocantins. Essa afirmativa pode ser verificada através regime de marés existente na região e a salinidade percebida na época de poucas chuvas (água salobra).
(Ilustração 10: imagem de satélite mostrando o Estuário Amazônico onde as águas do rio se misturam com as do oceano que determina o regime diário das marés)
Quanto ao regime de marés,
podemos nos referir às Marés de Quadratura, que são aquelas que apresentam
pequena amplitude, ou seja, aquelas que se seguem ao dia de quarto crescente ou
minguante; e às Marés de Sizígia, que são as que apresentam maiores amplitudes
e são verificadas, durante as luas nova e cheia, quando a influência da Lua e
do Sol se reforçam uma a outra, produzindo as maiores marés altas e as menores
marés baixas. Em Mosqueiro, a Média das Preamares de Sizígia e a Média das Preamares
de Quadratura alcançam valores respectivamente de 3,38 m e 2,66 m. A Média das
Baixa-mares de Sizígia e a Média de Baixa-mares de Quadratura apresentam
valores respectivamente de 0,31 m e 1,03 m.
(Ilustração 11: maré de Sizígia na praia do Maraú)
A declividade das praias influencia
diretamente nas características das ondas. Aquelas que apresentam baixa declividade
são propícias para a formação de ondas deslizantes, nas quais, as ondas
gradualmente empinam-se para então deslizar pelo perfil, dissipando sua energia
através de uma larga faixa da zona de surfe. Os trecho de praia com grande
declividade proporcionam ondas com pequena duração devido a zona de surf ser mais
estreita. Em locais onde foram construídos cais de arrimo na faixa de dissipação
de energia das ondas (praia do Murubira e praia do Porto Arthur), é grande a possibilidade de desmoronamento dos mesmos. A superfície das águas na Ilha do Mosqueiro,
em condições de baixamar, caracteriza um sistema relativamente tranquilo, com presença
de pequenas ondulações, que não chegam a 0.3 m de altura.
(Ilustração 12: reprodução da publicação Erosão e progradação no litoral brasileiro mostrando as células
de
deriva litorânea proposta para as praias da Zona Costeira do Pará, com base na observação
visual e
medida do clima de ondas
e na
morfologia das feições costeiras - Geoindicadores)
(Ilustração 13: ondas quebrando sobre o cais de arrimo construído na praia do Murubira)
Quanto ao fluxo de
sedimentos nas praias de Mosqueiro, de acordo com El-Robrini (2001), as praias
do Ariramba, Maraú e Paraíso não apresentam sazonalidade marcante, registrando,
assim, perdas e ganhos indiferentes às estações do ano. As praias do Murubira,
Chapéu Virado e Farol apresentaram perda em março e ganho em setembro. Apesar
da proximidade, o comportamento inverso ao das praias do Murubira, Chapéu
Virado e Farol, apresentado pela praia do Ariramba, sugere um provável
transporte efetivo de sedimentos paralelamente a praia, com sentidos se invertendo
ciclicamente ao longo do tempo.
Na Ilha do Mosqueiro, as
praias apresentam estreitas faixas de pós-praia, com algumas escarpas na zona de intermaré, sendo mais largas e íngremes,
caracterizando praias refletivas, com exceção das praias do São Francisco e
Paraíso, de menor declividade, constituindo praias de terraços de maré baixa. A
morfologia de algumas praias é marcada pela presença de algumas barras internas,
como no caso das praias do Ariramba, Maraú, Farol e Chapéu Virado, e barras
arenosas no início da zona de infra maré, nas praias do Ariramba e Maraú, com
granulometria variando desde areia grossa até fina (El-Robrini, 2001).
(Ilustração 14: praia do São Francisco onde se verifica "terraços de maré baixa")
Estas areias de praias
apresentam similaridades com a sequência estratigráfica local, representada
pelos sedimentos do Grupo Barreiras, que aflora em muitas praias durante a
baixamar, e os sedimentos pós-barreiras (Sá, 1969). El-Robrini (2001) mostra
que as amostras de sedimentos das praias do Farol, Chapéu Virado, Murubira,
Ariramba, São Francisco, Maraú e Paraíso apresentam variedade granulométrica,
com o domínio de areia média, seguida de amostras arenosas grossas e finas,
devendo ocorrer nas praias da Ilha do Mosqueiro alguma troca de sedimentos
entre as mesmas. A predominância de areia média foi explicada pela baixa
energia diária de ondas (Hb=0,8 m), o que contribui para a não remoção de
partículas mais grossas, não havendo nenhum mecanismo para deposição de areia
fina entre períodos de maior energia e, por não ocorrer ondas de swell longas, planas, que normalmente
são responsáveis pelo transporte de sedimentos finos.
Estudos (El-Robrini, 2001)
indicam que os processos de erosão e de progradação nas praias de Mosqueiro são
cíclicos. Nos períodos chuvoso (março) e seco (setembro), a princípio ocorre
retrogradação praial e engordamento praial, respectivamente. O pós-praia em
praticamente todas as praias recua durante o período chuvoso (março): na praia
do Paraíso, o pós-praia passa de 18,50 m (período seco) para 6,62 m (período
chuvoso); na praia do Farol, o pós-praia passa de 57,27 m (período seco) para
51,46 m (período chuvoso). Entretanto, a zona de intermaré sofreu também
erosão, como é mostrado: na praia do Paraíso, onde a largura passa de 7,35 m
(período chuvoso) a 85,26 m (período seco); e na praia do Murubira, a largura
passa de 23,75 m (período chuvoso) a 36,50 m (período seco). Nas figuras a
seguir, observam-se os perfis praiais médios e seu respectivo período na Ilha
do Mosqueiro.
Foi verificado que as praias
do Ariramba, São Francisco, Maraú e Paraíso
apresentaram episódios de perdas e ganhos indiferentes às estações do
ano (El Robrini, 2001), onde foi verificada uma maior capacidade de transporte
nestas praias. As praias do Farol, Chapéu Virado, Murubira, ao contrário,
revelaram um comportamento mais sazonal, com estreitamento do perfil em março (mais chuvoso), quando as ondas, associadas às marés de
sizígia, tornam-se mais altas nessa área, facilitando desta forma, a retirada
de sedimentos da zona de intermaré e engordamento em setembro (menos chuvoso,
menor energia de ondas), quando esse material arenoso é novamente remanejado para
a zona de intermaré.
(Ilustração 15: reprodução da publicação Erosão e progradação no litoral brasileiro mostrando os perfis praiais em alguns trechos da orla de Mosqueiro)
Em geral, as praias de
Mosqueiro, apresentaram uma variedade granulométrica, com o domínio de areia
média, devendo haver nas mesmas alguma troca de sedimentos entre elas. Nas
praias do Ariramba, São Francisco, Maraú e Paraíso, há predomínio de erosão, mais
expressivo em setembro, período de maiores velocidades do vento, aumentando a
capacidade de transporte nesse setor. Nas praias do Farol, Chapéu Virado e Murubira,
há tendência a deposição, em março e setembro. Levando-se a deduzir, que ocorre
um transporte longitudinal ao longo das praias, em períodos distintos, sendo, no
entanto, menor nas praias do Farol, Chapéu Virado e Murubira.
·
Aspectos
relativos ao Uso e Ocupação.
O processo de apropriação e
uso do solo da orla praiana de Mosqueiro inscreve-se em uma lógica maior,
relacionada ao processo de ocupação do arquipélago do Mosqueiro, que, por sua
vez, confunde-se com a própria história de colonização da Amazônia, em
particular do Estado do Pará e de sua capital Belém.
O vínculo de Mosqueiro com
a cidade de Belém supera a dimensão político-administrativa, sendo também
determinada por um tipo de relação social inserida na lógica da atividade
turística denominada de “veraneio”, dentre outras tipologias. Todas elas relacionadas
ao desenvolvimento desta prática, em particular na orla praiana.
O processo de uso e
ocupação do solo da orla praiana precisa ser interpretado a partir de sua
relação com a atividade do “veraneio” em três contextos históricos, porém
complementares, já que estabelecem, entre si, ao mesmo tempo, lógicas de
apropriação e uso diferenciado do espaço, mas que não se anulam e, sim,
interagem, simultaneamente, particularizando, em cada tempo, ritmos e dimensões
variadas desse espaço, estabelecendo, com isso, temporalidades e
territorialidades diversas entre os agentes que o produzem.
No
começo do processo colonizador, muito antes de Mosqueiro ser visto como um
balneário, o território era ocupado por diversos vilarejos localizados próximos
à baía, afinal o transporte era feito com auxílio de embarcações, os caminhos
terrestres quase não existiam. Entre esses vilarejos podemos destacar a Vila da
Baía do Sol, a Vila do Carananduba, a Vila do Chapéu Virado e finalmente a Vila
do Mosqueiro. Como em 1868 esta última passou a ser sede da Freguesia que
abrangia as demais, tudo passou a se chamar Mosqueiro. Deste período também
podemos citar alguns sítios agrícolas importantes para o abastecimento de
Belém, são os sítios, Conceição, Santana, Paysandu e a Fazendinha. Foi o
período onde se iniciou a ocupação da orla de Mosqueiro, porém sem grandes
impactos, tudo aconteceu de forma muito pontual e localizado em pequenos
trechos da orla.
(Ilustração 16: casa grande do Sítio Conceição)
(Ilustração 17: varanda da casa grande do Sítio Conceição)
As
transformações que ocorreram em Mosqueiro, durante o período áureo da borracha,
até a culminância da rodovia e da ponte, são frutos da dinâmica implementada a
partir da atividade turística, portanto, não podem ser desvinculadas da prática
do veraneio, que, nesse período, se constituía como a principal forma de lazer
e que se constitui em elemento determinante e fundamental para auxiliar na
análise da formação de um espaço turístico na orla e suas implicações.
Para
melhor compreensão, esse período foi subdividido em dois: o primeiro, que se
inicia com a época áurea da economia da borracha e estende-se até o início da
década de 60 do século XX, quando o acesso ao arquipélago se dava por via
fluvial e por este motivo intitulado como a “era dos navios”; e o segundo, de
apropriação e uso do solo pela atividade turística a partir da década de 60,
quando o acesso ao arquipélago e, consequentemente, à orla praiana, é
facilitado devido à interligação por via terrestre, período intitulado, como a
“era da rodovia”.
(Ilustração 18: navio Presidente Vargas símbolo máximo da "Era dos Navios")
(Ilustração 19: construção da ponte sobre o Furo das Marinhas, destaque na "Era da Rodovia")
Na orla praiana, a
discussão de Santos (2004) torna-se bastante apropriada, pois essas “novas”
variáveis podem ser identificadas como a infraestrutura urbana, a expansão de
atividades comerciais e de serviços, a especulação imobiliária, as políticas
públicas etc., a partir da inserção de novas demandas sociais, estimuladas pela
prática do “veraneio”, as quais estimulam a produção de novos objetos,
(re)organizando o espaço, para a adequação das necessidades das novas e das
antigas demandas sociais, ou seja, as formas (objetos) que surgem no espaço são
reflexos tanto de ações que se realizam no presente como aquelas que se
realizaram no passado e que deixaram suas marcas (grafias) impressas nas formas
espaciais do presente. É, neste sentido, o resultado das ações sociais sobre o
espaço intermediado pelos sistemas de objetos, naturais e artificiais
existentes na orla. As formas espaciais deste trecho de orla são, portanto, a
partir desta perspectiva, produzidas historicamente pelos diferentes agentes
envolvidos na atividade do “veraneio” e ganham contornos da lógica urbana.
No
período em que as pessoas tinham o acesso a Mosqueiro, apenas através de
navios, a infraestrutura instalada se expandiu da Vila do Mosqueiro na direção
da Vila do Chapéu Virado onde, nas proximidades, estavam as praias mais procuradas
pelos veranistas de então. No período seguinte, aquele onde as pessoas passaram
a vir pela rodovia, o vetor de desenvolvimento se intensificou na Vila do
Carananduba, e se expandiu na direção de praias, até então, pouco frequentadas.
Como consequência desse processo, hoje nós temos uma infraestrutura urbana
razoável na orla praiana que vai praia do Areão até a praia do Ariramba, deste
ponto em diante observa-se uma ocupação ainda rarefeita e a infraestrutura deficiente, em processo de implantação ou
simplesmente ausente. Os ocupantes da orla praiana ao norte, mais
especificamente na baía do Sol, lamentavelmente enfrentam dificuldades justamente por não ser
essa região muito procurada por veranistas.
Em
alguns trechos da orla praiana verificamos a existência da avenida denominada
de “Beira-Mar” separando a praia das residências lindeiras. Em outros a avenida
entra, fazendo que o espaço seja ocupado por diversos imóveis. Como
consequência, existe a obstrução da orla, impedindo o acesso das pessoas à
praia. É o caso de trechos da praia Grande, da praia do Porto Arthur, da praia
do São Francisco, dentre outras. Para evitar o agravamento desta situação é que
o Plano Diretor determinou como non
aedificandi essa faixa.
(Ilustração 20: fotografia aérea feita na década de 70 mostrando a Av. Beira Mar em trecho da orla praia Grande. Em alguns lotes localizados entre a praia e a avenida já se pode observar a construção de algumas casas)
(Ilustração 21: fotografia feita na década de 70 mostrando a recém pavimentada Av. Beira Mar na orla da praia do Murubira. Nesse trecho a avenida fica entre os imóveis construídos e a praia)
Em
muitos trechos da orla, a infraestrutura instalada (avenida, calçada, espaços
de convivência, quadras de esporte, cais de arrimo, dentre outros) foi
assentada sobre o leito praial. Uma das consequências é a constante necessidade
de repará-la em função dos danos causados pelas marés, particularmente pelas
marés de Sizígia. O sistema de drenagem existente está ultrapassado ou
simplesmente não existe, isso agrava sobremaneira a erosão, principalmente
próximo aos barrancos. Em praias onde esta infraestrutura ainda não existe, sua
colocação deve levar em conta a experiência das demais.
A maior
parte dos imóveis lindeiros à avenida Beira-Mar é da categoria “segunda
residência”, tipologia empregada, na área de estudos do turismo, para designar as
casas que são utilizadas por veranistas. Levantamento feito, em 2007, no trecho
da orla praiana localizada que vai da praia do Farol até a praia do Ariramba, registrou
247 imóveis enquadrados na tipologia de “segunda residência”, 45 imóveis
comerciais, 19 terrenos baldios, além de 9 edifícios.
(Ilustração 22: tabela contendo levantamento feito em 2007 com o uso dos lotes localizados em trecho da orla de Mosqueiro)
Dentre os
imóveis localizados nesses 320 lotes, 32 deles, portanto, 10% do total,
correspondem aos casarões construídos no início do século XX. Com forte
influência da arquitetura europeia (chalés), porém com importantes adaptações
ao clima local que é quente e úmido, constitui-se em importante conjunto
arquitetônico e histórico da região, patrimônio este que precisa ser
preservado. Com a falta de uma política pública que preserve esse patrimônio,
muitos exemplares já foram demolidos e outros estão colocados à venda; afinal
são propriedades de famílias que deixaram de frequentar Mosqueiro, por diversas
razões. Permanecendo essa tendência, a orla praiana perderá parte significativa
de sua história e um de seus principais atrativos.
(Ilustração 23: fotografias de casarões construídos na orla de Mosqueiro. Alguns foram demolidos e outros encontram-se em estado de abandono)
O Levantamento feito em
2007, também constatou que, naquele trecho da orla praiana, existe um grande
número de equipamentos voltados para o atendimento direto ou indireto dos
veranistas, tais como hotéis; restaurantes; bares; barracas de praia, que
oferecem alimentação e bebidas, espaços de convivência, posto de informação
turística, quadras de esporte, pista de skate, ciclovia, pista de Cooper,
mercado, farmácia, borracheiro, dentre outros.
(Ilustração 24: equipamentos públicos e comerciais instalados orla de Mosqueiro)
Se, por um lado, a
atividade de veraneio forçou a instalação e moldou a infraestrutura existente
na orla praiana de acordo com seus interesses, a grande sazonalidade de
demanda, provocada por esta prática, resultou em um grande desafio para a
gestão desse território. Enquanto a população residente fica em torno de 30 mil
pessoas, no período de alta estação, Mosqueiro chega a receber cerca de 500
mil. No caso da orla praiana, essa característica é potencializada
sobremaneira, por ser uma área bem estruturada e repleta de atrativos, é para
ela que convergem as principais atenções na alta estação. No restante do ano,
seu uso fica restrito a alguns momentos dos finais de semana e é pouco
utilizada no cotidiano dos moradores.
Outro efeito danoso dessa
sazonalidade está relacionado aos serviços públicos de limpeza das praias, de
coleta de lixo, de capinação, dentre outros, que são reduzidos,
significativamente, no período da baixa estação; a administração regional da
Prefeitura Municipal de Belém - PMB, no Distrito de Mosqueiro, tem a sua
estrutura subdimensionada e seu orçamento esvaziado, principalmente quando
levados em conta o crescimento da malha urbana de Mosqueiro e a consequente
complexidade da gestão.
Alguns bairros de
Mosqueiro concentram um número maior de moradores permanentes, são os casos da
Vila, do Carananduba e da Baía do Sol. Seguindo a tradição dos primeiros
moradores de Mosqueiro, ainda encontramos vários grupos de pescadores que
utilizam as praias localizadas nesses bairros para a prática da pesca,
inclusive para guardar os seus barcos. Na praia do areão e na praia da ponte,
ambas localizadas no bairro da Vila, é significativo o número de barcos que
vemos por lá, o mesmo ocorrendo nas praias da baía do Sol, onde a sede da
Colônia de Pescadores está localizada na orla e onde as festividades
tradicionais (São Pedro e Espírito Santo) são realizadas. No bairro do
Carananduba, a atividade pesqueira é muito intensa, mas foge do ambiente de
praia, está concentrada no rio Cajueiro.
As características de
algumas praias da região, tais como o vento e as ondas muito intensas,
principalmente entre os meses de setembro a novembro, fazem com que esportes
como o Surf, o Kite-surf e a Vela sejam bastante praticados. As praias do
Farol, Chapéu Virado, Maraú e Caruara são as favoritas dos praticantes desses
esportes.
(Ilustração 26: prática de surf na orla de Mosqueiro)
(Ilustração 27: prática de Kitie Surf na orla de Mosqueiro)
A falta do ordenamento do
espaço público é outra tendência, principalmente na alta estação, quando o lixo
se acumula e a poluição visual e sonora tornam-se insuportáveis. O uso
indiscriminado de produtos descartáveis e não biodegradáveis vem contribuindo
para a poluição da orla. A limpeza pública não retira resíduos sólidos de
dimensões pequenas (tampas de garrafas, pedaços de vidro, pregos, canudos de
refrigerante, etc.) que se misturam com as areias das praias e terminam por
comprometer a aparência dessas e a segurança dos seus usuários, particularmente
de crianças.
Enquanto a Prefeitura
resiste na Justiça Federal para não recuperar os Sistemas de Tratamento de
Esgoto, são inúmeros os efluentes de águas pluviais, contaminados pelos
esgotos, que lançam suas águas nas praias, podendo a comprometer a
balneabilidade das águas e colocando em risco a saúde dos seus usuários.
Considerando a importância do turismo para a economia local, poluir as praias também
significa destruir as condições de sustentabilidade das bases da economia
local.
Outro aspecto que merece
uma atenção especial é o crescimento em número e tamanho das barracas
construídas na orla para o atendimento dos visitantes com comidas e bebidas.
Muitas estão crescendo de tamanho, outras foram construídas na areia sem
qualquer licenciamento prévio, quase todas possuem fossas que não são sépticas.
Tudo isso sem que a Prefeitura tome qualquer atitude efetiva para reverter o
quadro e sem que a Secretaria do Patrimônio da União intervenha. O resultado
tem sido o comprometimento da paisagem, com a redução sucessiva dos espaços
onde a praia pode ser vista de forma direta por quem passa na Avenida, e a
poluição do ambiente. Algumas barracas promovem festas noturnas com som
bastante alto, incomodando quem mora por perto.
(Ilustração 29: barracas de praia construídas sobre o leito praial)
(Ilustração 30: barraca de praia na orla da praia do Paraíso)
Durante a alta estação,
muitos bancos, centros comerciais e ambulantes buscam um espaço na orla para se
instalar, até o poder público instala arenas para a prática de eventos
esportivos e palcos para apresentações culturais, sem que seja respeitado um
índice máximo de ocupação linear da praia. A continuar assim, em breve, serão
necessários programas para “abrir janelas ou portas para as praias”.
A
necessidade de um Plano de Gestão Compartilhada.
Conforme o leitor do Blog Mosqueiro Pará Brasil pôde
perceber, enfrentar os desafios para a proteção desse tesouro que denominamos
de orla praiana de Mosqueiro, com suas paisagens e sua história, não é tarefa
fácil.
Muitos são os atores sociais
com seus próprios interesses, muitas vezes conflitantes, assim como são muitas
as instituições públicas com responsabilidades na gestão deste território. A
complexidade da gestão é tamanha que extrapola o raio de ação e competência de
um só “ente” da República Federativa do Brasil, Município, Estado e União que
possuem as suas próprias responsabilidades.
Se as dificuldades são
grandes, isso não justifica a omissão por parte dos governos e da sociedade
civil. A Constituição Federal preconiza o Pacto Federativo onde os entes
federados devem agir de maneira a responder adequadamente aos anseios da
sociedade brasileira.
O Pacto Federativo deve
ser traduzido pela ação solidária entre os três níveis de governo nas áreas
política, econômica e social, visando ao atendimento à sociedade de forma
eficiente, racional e efetiva. Para isso, é preciso levar em conta a vocação de
cada ente federado, sua capacidade de implementação, os custos e a eficiência
na execução dos serviços públicos, e os benefícios decorrentes para o cidadão.
Quando efetivado, o Pacto
Federativo permite a construção de políticas públicas claras e transparentes em
uma discussão integrada pelos três níveis de governo. Políticas que não serão
definidas de forma unilateral e impostas de cima para baixo. Pressupõe,
portanto, um regime de colaboração, e não a simples transferência de
responsabilidades.
Desta forma, o
enfrentamento dos desafios verificados na orla praiana de Mosqueiro exige um
esforço para a consolidação de uma gestão conjunta e integrada do Município, do
Estado e da União. A gestão e o planejamento não estão dissociados, portanto
não ocorrem em momentos distintos e o planejamento deve ser encarado como
processo. Assim sendo, este não deve ser confundido com o plano que será um dos
produtos de um amplo processo de análises e acordos. Para que este modelo de
gestão se materialize, se faz necessário o desenvolvimento de um processo de
planejamento que culmine com a formulação de um Plano de Gestão Compartilhada
da Orla Praiana de Mosqueiro.
No sentido de superar
questões como as verificadas na orla praiana de Mosqueiro, o Decreto 5.300, ao
regulamentar, em 2004, a Lei N° 7.661 que instituiu o Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro (PNGC), estabeleceu os limites, objetivos, instrumentos
e competências para gestão da orla dos municípios costeiros. A norma também
prevê que deve ser elaborado um Plano de Intervenção da Orla, de modo
participativo com o colegiado municipal, órgãos, instituições e organizações da
sociedade civil.
Para materializar o que
ficou estabelecido no Decreto 5.300, o programa conhecido como Projeto de
Gestão Integrada da Orla Marítima – Projeto Orla, conduzido nacionalmente pelo
Ministério do Meio Ambiente e pela Secretaria do Patrimônio da União, do
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, buscou contribuir, em escala
nacional, a aplicação de diretrizes gerais de disciplinamento de uso e ocupação
de um espaço que constitui a sustentação natural e econômica da zona costeira,
a Orla Marítima. Nos estados, o Projeto Orla conta com os órgãos ambientais e
as superintendências do Patrimônio da União em sua Coordenação. Nos municípios
que aderiram, a coordenação é da Prefeitura com o apoio de um Conselho Gestor
paritário.
Segundo documentos
produzidos pelo Projeto Orla, este apresenta em sua concepção “... o desafio em
lidar com a diversidade de situações representadas pela extensão dessa faixa,
que atinge 8.500 km e aproximadamente 300 municípios litorâneos, que perfazem,
segundo o último censo, uma população em torno de 32 milhões de habitantes”,
Belém está entre eles. Acompanhando esses aspectos, encontra-se a crescente
geração de conflitos quanto à destinação de terrenos e demais bens sob o
domínio da União, com reflexos nos espaços que são considerados de uso comum do
povo.
O modelo de gestão do
Projeto Orla obedece ao Pacto Federativo, que envolve princípios e procedimentos
de ação compartilhada entre as três esferas governamentais e a participação da
sociedade civil. Estimula-se, assim, a implantação de uma rede de parcerias
tendo como objetivo as intervenções necessárias ao uso comum desse espaço, com
planejamento ambiental e territorial e divisão clara de tarefas entre todas as
partes.
Ao aderir o Projeto Orla
com o objetivo de elaborar, de forma participativa, um Plano de Gestão
Compartilhada para a Orla Praiana de Mosqueiro, a Prefeitura de Belém poderá
usufruir de vantagens tais como:
Oportunizar a democratização e a descentralização da gestão
patrimonial, ambiental, desenvolvimento urbano e turístico;
Permitir a divulgação, compreensão e a pactuação entre entes
federados e sociedade civil dos projetos estratégicos necessários para a Orla;
Favorecer a mitigação de danos socioambientais existentes e
intervenções proativas de danos socioambientais iminentes permitindo que os
imóveis da União e outras propriedades cumpram sua função socioambiental;
Favorecer a integração de políticas públicas nas dimensões
vertical e horizontal;
Antecipar demandas oriundas de novos empreendimentos
subsidiando o processo de tomadas de decisão;
Favorecer o planejamento e o ordenamento territorial
articulando as políticas socioambiental, patrimonial, econômica e de
desenvolvimento urbano;
Possibilitar a visibilidade das ações do governo para o
cidadão.
A implantação de modelo de
gestão com essas características enfrentará algumas dificuldades que não devem
ser obstáculo para os avanços necessários. Como se constitui basicamente em uma
dinâmica participativa de planejamento e gestão com amplo espectro de mobilização
dos atores envolvidos, ele esbarra na cultura centralizadora dos gestores
públicos que não enxergam com bons olhos a possibilidade de compartilhar as
decisões, ainda persiste a ideia de que as políticas públicas são favores
ofertados pelos governantes e não uma conquista da sociedade. O perfil
clientelista, patrimonialista e fisiológico dos governos ainda não foi superado
no Brasil. Integrar ações dentro de uma só esfera de governo não é tarefa
fácil, imaginem a dimensão que elas alcançam quando estamos tratando de esferas
distintas, muitas vezes lideradas por partidos com ideologias diferenciadas.
Enquanto alguns gestores
públicos continuam tratando o bem público segundo os seus interesses pessoais e
partidários, os problemas vão se acumulando. As mudanças climáticas estão
produzindo eventos extremos, como a elevação do nível do mar, estiagens
prolongadas em alguns lugares e cheias em outros, os efeitos muitas vezes são
devastadores. As ocupações irregulares verificadas na orla praiana só tem agravado
o quadro de degradação ambiental e de desgaste de Mosqueiro enquanto destino
turístico de qualidade. Tudo isso compromete a qualidade de vida dos moradores
de Mosqueiro.
As visões unilaterais e
partidárias não podem se sobrepor às questões de interesse público. A proposta
de elaboração de um Plano de Gestão Compartilhada para a Orla Praiana de
Mosqueiro está inserida na dimensão do desenvolvimento local e sustentável, mas
também deve ser visto como iniciativa do Estado brasileiro e não de um governo.
Não faz
muito tempo que um meio de comunicação, após ampla consulta popular, apontou
Mosqueiro entre as “Sete Maravilhas do Estado do Pará”. Publico este texto
porque acredito que a gestão radicalmente democrática e transparente é a única
forma de recuperar esse tesouro tão precioso para os paraenses, que é a Orla
Praiana de Mosqueiro.
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Gostei muito do trabalho. Bonito, com conteúdo variado, ótimo para divulgação da ideia da valorização da orla.
ResponderExcluirPerfeito excelente trabalho professor, sempre defendendo a nossa ilha com propriedade!
ResponderExcluirLindo trabalho,mas precisa ser divulgado p ser feito na prática.Infelizmente a consciencia ecologica e a preservaçao ambiental está escassa,somos imediatistas...acredito q mobilizando atores podemos adquirir muitos benefícios desse projeto único..parabéns professor.
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