Muitos que frequentam Mosqueiro, até mesmo aqueles que possuem residência na Rua da Bateria ou estudam nos colégios que lá existem, desconhecem porque ela recebe este nome. Vários prédios públicos e o que abriga o Colégio Nossa Senhora do Ó fazem parte dessa história. Chegou para mim o texto de Ivens Coimbra Brandão que, na minha opinião, elucida bastante essa questão, traz luz para um passado que encontra-se na penumbra da história. Considerando que ele foi escrito em 2005 o leitor deverá fazer a atualização e considerar que os fatos descritos aconteceram a 61 anos atrás. Segue abaixo para os leitores do Blog Mosqueiro Pará Brasil o texto na íntegra.
"Aconteceu
durante muitos anos, isto nas décadas de 70 e 80, o articulista, esposa e
filhos se deslocarem para Mosqueiro quase todos os finais de semana. Também nos
feriados da Semana Santa lá estavam, acompanhando as celebrações que eram
realizadas na Capela anexa ao Colégio Nossa Senhora do O’, na Estrada da
Bateria no Chapéu-Virado. Geralmente, quem presidia as celebrações era o bispo
auxiliar de Belém, D. Tadeu Prost, tendo como concelebrante o diácono José
Rassy.
Mas não era
só no período da Semana Santa que aquela família frequentava a referida Capela,
isto porque mantinham certo relacionamento com as religiosas que ali prestavam,
e prestam serviço. Assim é que, em um final de semana da época natalina,
estiveram visitando aquela comunidade, tendo sido recebidos no hall do prédio
onde funciona o Colégio. No decorrer da conversa, o articulista foi como que
sugado pelo túnel do tempo, pois havia estado naquele mesmo lugar, acantonado
por cerca de três dias, muitos anos antes, quando prestava o serviço militar,
na condição de aluno do então CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da
Reserva).
As lembranças
vieram aos borbotões, mas ora sendo devidamente arrumadas de tal maneira a
melhor informar. Decorria o ano de 1953, quando aquele contingente de alunos
foi levado no navio Almirante Alexandrino, para um acantonamento em Mosqueiro,
tendo como local o prédio onde hoje funciona o Colégio N.S. do O’, mas que
durante a 2ª Guerra Mundial havia abrigado uma Bateria de Artilharia de Costa,
daí o nome pelo qual é conhecida a “Estrada da Bateria”. O local era
estratégico, propiciando serem os canhões dispostos na orla do Chapéu-Virado,
protegendo Belém de incursões navais, como confirma o veterano militar
reformado Aladim Raiol da Conceição. Os canhões eram de grande porte,
disparando granadas com 105
mm de diâmetro, sendo deslocados em carretas com enormes
pneus.
Voltemos
então, a acompanhar aquele grupo de jovens que estava para concluir o CPOR.
Todos cursavam ou tinham concluído o que hoje é chamado de Convênio, alguns já
tendo iniciado um curso superior, daí porque no período de aulas a instrução
militar era aos domingos, e em tempo integral nas férias escolares. Chegando a
Mosqueiro, sob o peso da farda e do equipamento, ficou na lembrança o ambiente
e as condições da dormida, tudo sob uma iluminação das mais deficientes, e
instalações sanitárias precárias. O alojamento era amplo, sendo fornecido a
cada aluno um colchonete, a ser estendido no chão. Dado o “toque de silêncio”,
o jeito era se deixar vencer pelo cansaço e dormir, assim superando o
desconforto.
O dia
começava às 5h30, com o “toque de alvorada”. Depois de um dia cansativo,
seguido por uma noite mal dormida, o toque daquela corneta como que penetrava
fundo, atingindo a “alma”. Depois do asseio matinal seguia-se a primeira
refeição do dia, e depois trabalho. A principal instrução era de tiro real,
sendo o armamento posicionado na parte mais alta da orla do Chapéu-Virado,
pouco antes da curva para o Porto Arthur. O alvo era uma ilhota de pedras
encimada por um pedaço de trilho fincado verticalmente, situado a alguns
quilômetros da praia, daí porque só ser distinguido com auxílio de
binóculos.
A munição era
toda transportada “no braço”, desde o quartel da “Bateria”, até o local de
tiro. Ficou indelével na memória, o esforço de carregar as granadas de
morteiro, que vinham acondicionadas em caixas de madeira, com alças de corda.
Os petardos eram pintados de amarelo, sinalizando que tinham o mesmo poder
explosivo das utilizadas na guerra. Nem mesmo o entusiasmo daqueles jovens com
19 anos em média, neutralizava a consciência do risco, pelo contacto direto com
explosivos. O armamento utilizado para instrução era constituído de morteiros
para granadas de 81 mm; canhões de fabricação alemã da marca Krupp, com 75 mm , que tinham sido
utilizados na 1ª Guerra Mundial; e bazucas, um armamento com dispositivo
elétrico de disparo, que aciona um foguete para impulsionar a granada.
A cada
disparo de canhão o barulho era ensurdecedor, gerando um deslocamento de ar com
aumento de pressão tal, que era recomendado abrir a boca na hora do tiro, para
não se ter o tímpano danificado. Tanto nos tiros de canhão como de morteiro, os
alvos estão distantes, daí porque os atiradores não sentirem “de perto” os
efeitos das granadas lançadas. Mas no tiro com bazuca, o alvo deve estar
próximo, a cerca de 40
metros , daí porque o atirador sentir, de perto, os
efeitos da explosão. Ao ouvir o forte ruído de um tiro de canhão, ou ver de
perto os estragos causados por um disparo de bazuca, tudo passado em um
treinamento, fica-se imaginando as barbaridades que ocorrem nas guerras, o que
contraria não só o natural instinto de conservação da vida, mas, sobretudo, a
dignidade que o homem e a mulher encerram.
Aqueles que
hoje estudam no Colégio Nossa Senhora do O’ saibam, que há 52 anos lá esteve
acantonado um grupo de jovens a receber treinamento para a guerra, mas ficando
neles implantada a semente de uma árvore a lançar os frutos da paz."
(Foto de Ivens Brandão em um acantonamento em Mosqueiro quando era aluno do CPOR)
Consultando a obra do Meira Filho, descobri que as instalações onde funcionaram a Bateria de Costa do Exército foram construídas pela Prefeitura para servir de Colônia de Férias dos alunos das escolas municipais.
ResponderExcluirMosqueiro era considerado um ponto estratégico durante a 2a,guerra mundial,.Dizia-se que por ali passavam submarinos alemães.Daí os canhões em praias como a do Chapéu
ResponderExcluirVirado. O nome "Bateria"ficou como a estrada, depois rua, aberta pelos militares em paralelo á beira-mar Farol. Norte-americanos e brasileiros faziam ponto ali.
Fantástica história. Obrigado por trazer esse conhecimento sobre a ilha querida de Mosqueiro, que por muitos só e lembrada pelas praias que possui.
ResponderExcluirSe sensacional explanação, a tempos queria saber o significado do canhão na Praia do Bispo e acabo por descobrir uma espetacular história sobre a Ruanda bateria, colégio Nossa Senhora do O e Acantonados, e fiquei sabendo que também da existência de outros canhões a que defendiam a entrada de Belém pela Baía, SIMPLESMENTE BELÍSSIMO RELATO.
ResponderExcluir