Farol de Mosqueiro

Farol de Mosqueiro
Farol de Mosqueiro

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Terezinha (não) foi a festa.

Terezinha tinha dezesseis anos e morava com os pais Manoel e Graça e o irmão Pedro numa casa de madeira, com quatro cômodos, construída no fundo do quintal de um Casarão parecido com aqueles chalés que vemos em fotografias da França e da Suíça. A casa ficava de frente para a praia do Chapéu Virado, Ilha de Mosqueiro. Dizem que este nome foi dado porque ali havia artesãos que fabricavam chapéus de palha com aba, isto é, um chapéu beirado, um chapéu virado.

O casarão foi construído sobre uma estrutura de alvenaria de pedra que elevava seus cômodos cerca de dois metros do solo, com isso, seus construtores evitavam a umidade, bastante elevada por aquelas bandas. Suas paredes eram de madeira, com exceção do banheiro e da cozinha que era de taipa de pilão. Seu assoalho, sustentado por vigas de madeira de lei, alternava tábuas de acapú e pau amarelo constituindo desenhos variados. O acesso ao casarão era feito por uma escadaria cujos degraus eram de pedra lioz. Contornando as laterais e a frente do casarão existiam varandas que evitavam a insolação em seus cômodos. Alguns corajosos arriscavam dormir em redes que eram atadas nessas varandas, muitos terminavam desistindo diante do vento frio que soprava da praia. Um detalhe interessante de sua fachada era um trançado feito com pequenas peças de madeira, chamadas de lambrequim, que dava a sensação de que lá havia um bordado feito por mãos caprichosas. Suas telhas, conhecidas como francesas, foram compradas na ilha de São Pedro, localizada entre a baía de Santo Antônio e o furo das Marinhas.



Os pais de Terezinha eram os responsáveis pela limpeza e manutenção da propriedade. Toda semana, eles abriam o casarão, varriam, passavam o pano no assoalho, tiravam a poeira dos móveis e colocavam os colchões sob o sol. Assim, evitavam que o mofo tomasse conta do ambiente. Sempre a espera dos seus proprietários. Quando estes não chegavam, recolhiam tudo, fechavam e trancavam suas portas e janelas.

Comentava-se que Manoel, pai de Terezinha, havia colocado uma jibóia no forro do casarão para que comesse ratos e outros animais que ali entrassem. Quando questionado a respeito de barulhos estranhos, Manoel logo dizia – é o vento, não há o que temer! Habilidoso jardineiro, Manoel cuidava dos canteiros e das diversas árvores frutíferas que haviam por ali, particularmente de alguns pés de Jasmim Santo Antônio estrategicamente plantados próximos às janelas dos quartos. Em troca de seus serviços, a família de Terezinha tinha a permissão de morar na casinha do fundo do quintal, consumir frutas e verduras produzidas no terreno, criar galinha caipira e alguns patos, além de uma pequena importância em dinheiro repassada pelos proprietários em períodos incertos.

Terezinha não teve oportunidade de freqüentar uma escola, quando não estava ajudando sua família na limpeza do casarão ou nos afazeres domésticos, passava horas correndo nas areias da praia, sempre em companhia de suas melhores amigas, as irmãs Jacira e Jaciara. Gostava de tomar banho de praia, principalmente na enchente quando as ondas eram maiores, também corria na areia em busca de algum Ajuruzeiro onde pudesse subir e saborear os seus frutos arroxeados. Na praia havia alguns arbustos com flores amarelas de onde retirava suas sementes dizendo que era dinheiro, seu formato parecia de uma moeda.
Em um certo dia, do ano de 1923, Terezinha e suas amigas souberam da organização de uma festa próxima da rua das mangueiras, antiga estrada de terra que ligava o Chapéu Virado à Vila. Depois de muita insistência, Terezinha conseguiu convencer seus pais para deixa-la ir à festa, as condições eram que seu irmão Pedro deveria acompanhá-la e ambos deveriam estar de volta às dez horas da noite.

Ao cair da tarde, os quatro jovens já estavam se arrumando. Após beberem um café preto acompanhado de pão com manteiga, tomaram a benção de seus pais e partiram ansiosos para a festa. Já havia anoitecido e como Mosqueiro não possuía iluminação pública, só podiam contar com a luz do luar refletida sobre as águas. Caminharam alguns metros, quando estavam se aproximando do chalé do Coronel Lorenço Lucidoro Ferreira da Mota, conhecido como coronel Loló, de repente, Jaciara parou e arregalou os olhos, os demais logo entenderam a razão de tanto espanto. Com as pernas trêmulas, coração acelerado e pêlos arrepiados os quatro puderam viram na varanda da casa, que permanecia com portas e janelas fechadas, encontrava-se um caixão todo preto, cercado de vasos com flores brancas. Não havia uma “viva alma”, ou será que havia? Neste instante, Pedro foi buscar o último fio de coragem que lhe tinha restado e disse – precisamos nos aproximar para ver se não estamos enganados. Deram somente alguns passos em direção ao chalé e logo partiram em desabalada carreira de volta para casa, onde foram chamar seus pais.

(Casa de praia do Coronel Lorenço Lucidoro Ferreira da Mota, coronel Loló)

Descrentes da história que acabaram de ouvir, mas diante de tanta insistência, eles cederam e foram verificar o que estava acontecendo. Ao chegar no local, perceberam que os jovens não estavam brincando, o que viram era de fato muito estranho. O certo é que aproveitaram que tinham um argumento incontestável e proibiram todos de sair naquela noite, além de recomendar para rezarem um Padre Nosso e uma Ave Maria antes de dormir.

No dia seguinte, o sol mal havia nascido e Terezinha já estava de pé caminhando descalça pela praia, junto com as amigas. Elas queriam ver se o caixão permanecia na varanda do chalé do coronel Loló. Encontraram a varanda da casa vazia, somente dois Bem-te-vis estavam pousados sobre o guarda corpo.

Passaram-se os dias, e o acontecido foi ficando para trás. Após quatro meses do ocorrido, chegou a notícia, o coronel Loló havia falecido e a data todos já devem imaginar. Coincidência ou não foi na noite da festa que a Terezinha gostaria que ficasse para sempre na memória, mas por outros motivos. A residência do Coronel Loló mais tarde, acrescida de um sobrado, foi transformada em “Casa de Hóspedes”. Propriedade já da família Cipriano Santos, foi negociada e demolida dando lugar à atual edificação do condomínio, denominado Lilian-Lúcia. Terezinha, hoje D. Tereza, casou, teve filhos e mora em uma pequena casa de madeira, próximo à Rua das Mangueiras.


Um comentário:

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